top of page

O crime de stalking e a romantização da violência 

A série americana You narra a história do personagem Joe Goldberg, um homem aparentemente normal e gentil que se revela um perseguidor obsessivo. Em busca de conquistar a garota dos seus sonhos, Joe utiliza as redes sociais para rastrear passos, roubar informações e invadir a privacidade das vítimas, estando disposto em eliminar quem ele considera um obstáculo. O comportamento do personagem choca nós, telespectadores, mas também nos faz refletir sobre até quando o romantismo pode se transformar em abuso. 

Infelizmente, o terror retratado na TV não está longe da vida real. Em 2016, a apresentadora Ana Hickmann teve seu quarto de hotel invadido por um homem que se dizia seu fã. Durante a confusão, o invasor, armado, manteve Ana e seu cunhado e cunhada de reféns do qual, foi contido pelo cunhado de Ana, que, em legítima defesa, acabou tirando a vida do invasor. 

Essa prática de perseguição se chama stalking, termo de origem inglesa que significa perseguir ou rastrear. No Brasil, o “stalking" se tornou crime em 2021, com a entrada em vigor da chamada Lei do Stalking (Lei nº 14.132/21). A legislação define o crime como uma conduta repetitiva e invasiva que compromete a liberdade, a segurança e o bem-estar emocional da vítima. Trata-se de um comportamento que pode acontecer presencialmente ou de forma virtual, por meio de mensagens, ligações ou ameaças explícitas, tudo com o objetivo de intimidar, controlar ou assediar alguém. 

Art. 147-A. Perseguir alguém, reiteradamente 

e por qualquer meio, ameaçando-lhe a 

integridade física ou psicológica, 

restringindo-lhe a capacidade de locomoção 

ou, de qualquer forma, invadindo ou 

perturbando sua esfera de liberdade ou 

privacidade. 

Pena – reclusão, de 6 (seis) meses a 2 (dois) 

anos, e multa. 

§ 1º A pena é aumentada de metade se o crime 

é cometido: 

I – contra criança, adolescente ou idoso; 

II – contra mulher por razões da condição de 

sexo feminino, nos termos do § 2º-A do art. 121 

deste Código; 

III – mediante concurso de 2 (duas) ou mais 

pessoas ou com o emprego de arma.” 

Entretanto, apesar do crime estar tipificado oficialmente no Código Penal, essa prática ainda é tratada com menos seriedade do que deveria. Atualmente, sua penalização é de 6 meses a 2 anos de prisão, o que é considerado pouco diante dos danos psicológicos e do perigo em que as vítimas foram expostas.

Além disso, uma das grandes dificuldades enfrentadas pelas vítimas é reunir provas de que estão sendo perseguidas, especialmente nos casos de stalking digital. Mensagens, e-mails, registros de chamadas e interações em redes sociais podem ser facilmente apagados ou manipulados, dificultando a comprovação dos atos. A identificação dos agressores também é complicada, pois muitos utilizam perfis falsos e aplicativos que ocultam suas identidades. Diante disso, muitas vezes as vítimas desistem de prestar queixa devido à dificuldade de encontrar provas concretas, o que resulta na permanência da violência e na impunidade dos criminosos. 

Ademais, o stalking é banalizado culturalmente na nossa sociedade. Desde pequenas, as mulheres são ensinadas a ver a insistência como um gesto romântico. Em muitos filmes,séries e músicas esse tipo de comportamento é retratado como demonstração de amor banalizando a prática do crime e dificultando as vítimas de reconhecerem essa violência. 

A partir disso, ocorre a romantização da violência e é de extrema importância que esse tópico seja discutido, porque enquanto formos ensinados a ver comportamentos invasivos como parte natural do amor, estaremos incentivando, mesmo sem querer, o crescimento de relações tóxicas e, muitas vezes, perigosas. 

O stalking pode parecer, para alguns, apenas um incômodo mas, na verdade, ele é o primeiro passo de diversas violências que podem terminar em agressões físicas. Qualquer pessoa pode ser vítima desse crime, sendo mulher, homem, adolescente, idosos, e não sendo restrito a pessoas famosas. 

Portanto, é essencial que o crime de stalking seja levado a sério. Para isso, é preciso fortalecer delegacias especializadas, facilitar denúncias, oferecer apoio psicológico às vítimas e garantir punições mais efetivas. 



REFERÊNCIAS: 

BRASIL. Lei nº 14.132, de 31 de março de 2021. Insere o art. 147-A ao Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), para tipificar o crime de perseguição. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, 1 abr. 2021. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2021/lei/l14132.htm. Acesso em: 9 maio 2025. 

CÂMARA DOS DEPUTADOS. Entra em vigor lei que criminaliza perseguição, inclusive na internet. Brasília, 2021. Disponível em: https://www.camara.leg.br/noticias/742273-ENTRA-EM-VIGOR-LEI-QUE-CRIMINALIZA-PE RSEGUICAO,-INCLUSIVE-NA-INTERNET. Acesso em: 9 maio 2025. 

CORREIO BRAZILIENSE. Cyberstalking: perseguição virtual e desafios da tutela penal na era digital. Brasília, 2024. Disponível em: https://www.correiobraziliense.com.br/direito-e-justica/2024/11/6993280-cyberstalking-perse guicao-virtual-e-desafios-da-tutela-penal-na-era-digital.html. Acesso em: 9 maio 2025. 

G1. Stalking: entenda quando a perseguição na internet se torna crime. Globo, 17 mar. 2025. Disponível em: https://g1.globo.com/tecnologia/noticia/2025/03/17/stalking-entenda-quando-a-perseguicao na-internet-se-torna-crime.ghtml. Acesso em: 9 maio 2025.

JUSBRASIL. O crime de stalking no Brasil: desafios e perspectivas após a Lei 14.132/2021. 2024. Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/artigos/o-crime-de-stalking-no-brasil-desafios-e-perspectivas-ap os-a-lei-14132-2021/2931462467?utm_source=chatgpt.com. Acesso em: 9 maio 2025. 

SOUZA, Jayne Oliveira de; SOUZA, Ivan Clementino de. Considerações acerca do stalking no ordenamento jurídico brasileiro: paralelo entre casos reais e a série "You". Revista Jurídica da Escola Superior do Ministério Público de São Paulo, São Paulo, v. 23, 19 dez. 2023. Disponível em: https://es.mpsp.mp.br/revista_esmp/index.php/RJESMPSP/article/view/542. Acesso em: 9 maio 2025.

Posts recentes

Ver tudo

Comments


Instagram: @Jornal.Tres

E-mail: Jornal.tr3s@gmail.com

Brasília-DF​

Fique informado, junte-se à nossa newsletter

Obrigado pela inscrição!

bottom of page